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Fusões e aquisições ensaiam retomada após queda em 2023

Bancos veem melhora nas condições de mercado após volume de negócios ter caído 17% no ano passado, para R$ 234 bi

Greenlees: Melhora nos preços de empresas comparáveis na bolsa deve ajudar a aumentar ritmo de transações — Foto: Gabriel Reis/Valor

Depois de um ano em que não faltaram desafios para a venda de ativos, a fila de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) deve ganhar ritmo. Ainda há incertezas rondando o mercado, mas o setor prevê um 2024 de mais normalidade e com algumas transações de grande porte.

No ano passado, o volume de operações anunciadas até 27 de dezembro chegou a R$ 234 bilhões, o que representa uma queda de 17% na comparação com 2022, quando o segmento movimentou R$ 283,04 bilhões. Os dados são da consultoria Dealogic e já consideram o anúncio da venda da Amil para o empresário José Seripieri Junior, por R$ 11 bilhões. O negócio, acertado logo antes do Natal, foi um dos maiores de 2023 e ajudou a atenuar a queda, mas não impediu que o desempenho do ano passado fosse o pior dos últimos seis.

Com os sinais de melhora que entraram em cena principalmente a partir do segundo semestre de 2023, os bancos de investimento que atuam no Brasil voltaram a ganhar mandatos. Assim, a expectativa é que as operações ganhem tração.

Entre as transações aguardadas para ter um desfecho em 2024, há negócios multibilionários, com potencial de alavancar o volume anual. Dentre eles, as expectativas recaem sobre a eventual fusão entre Eneva e Vibra e a venda da Braskem, processo que se arrasta há anos.

“O ano [passado] começou muito adverso, mas depois de março os diálogos foram retomados e na metade do ano essas conversas viraram mandatos. E a expectativa é que esses mandatos virem transações em 2024”, diz o responsável pela área de fusões e aquisições do Bank of America, Diogo Aragão.

“Os estrangeiros voltaram a olhar Brasil com mais força. O interesse ainda está muito forte”

— Fabio Medeiros

O executivo afirma que o cenário volátil segue no jogo, mas observa que, no nível atual, já se permite que empresas voltem a pensar em operações estratégicas, abrindo espaço para o avanço das agendas de M&A. Aragão relembra que 2022 já havia sido um ano adverso para fusões e aquisições, no mercado local, com algumas operações ficando em compasso de espera por conta das eleições presidenciais.

Bruno Amaral, sócio do BTG Pactual da área de M&A, afirma que, no segundo semestre do ano passado, a indústria ganhou tração, o que refletiu no aumento no número de mandatos na instituição financeira. “Vimos uma segunda metade do ano bem mais forte do que a primeira e um movimento muito pautado pela volta do interesse estrangeiro.”

No entanto, segundo o executivo, mais do que o crescimento do número de transações, a melhora no ambiente se observa pela redução no tempo de fechamento dos negócios. Os acordos, que vinham levando entre nove e 18 meses para ser concluídos, voltaram para o ritmo considerado normal, de seis a 12 meses. “Estamos nos beneficiando de diversos fatores, com câmbio estável e a bolsa em um patamar melhor do que vínhamos em outras épocas do ano”, diz.

O responsável global pelo banco de investimento do Itaú BBA, Roderick Greenlees, confirma que mais recentemente alguns mandatos de M&A que estavam no “pipeline” (em preparação) começaram a ganhar tração. Há também uma expectativa de que transações paradas na prateleira voltem à rua. Segundo o executivo, a melhora dos “valuations” (avaliações) de empresas comparáveis listadas em bolsa deve ajudar a imprimir um ritmo mais forte à fila de operações neste ano, com a aproximação dos preços dos ativos esperados por vendedores e compradores.

Além da melhora no preço, as condições de financiamento – outro pilar fundamental para essa indústria – voltou à normalidade depois do baque sofrido no início de 2023. Naquele momento, as crises da Americanas e da Light secaram de forma abrupta o mercado de renda fixa local.

Na visão do responsável pelo banco de investimento do Bradesco BBI, Felipe Thut, a expectativa é que o financiamento seja funcional o ano todo, e a preços mais baixos, na esteira do corte de juros, o que favorece as operações de fusões e aquisições. “O mercado de M&A será melhor em 2024 por uma combinação de fatores, seja pela redução da incerteza política fiscal, pela questão de corte de juros e pelo financiamento de M&A mais barato”, diz.

A posição relativa do Brasil no mundo é outro fator que deve beneficiar as transações que estão na mesa. Aragão, do BofA, aponta como destaque o fluxo de investimento de capital árabe e chinês rumo ao país. “A América Latina se tornou uma geografia neutra e isso tem atraído os olhares para o Brasil”, afirma.

Com isso, é esperado que o comprador mantenha um papel de destaque nas transações neste ano, reforça o responsável pelo banco de investimento do Morgan Stanley no Brasil, Fabio Medeiros. “Os estrangeiros voltaram a olhar Brasil com mais força. O interesse ainda está muito forte.

Em 2023, a participação dos estrangeiros nas operações superou a média histórica, o que deve se repetir neste ano, de acordo com o executivo. Os setores de infraestrutura, energia, agronegócios, óleo e gás e mineração tendem a se manter como os mais atrativos. “Assim como no ano passado veremos ‘deals’ [transações] maiores em setores mais globalizados”, diz Medeiros.

Para o presidente do banco de investimento do UBS BB, Daniel Bassan, 2024 será um ano mais positivo para M&A, com um impulso tanto negócios “oportunísticos” como daqueles envolvendo empresas se desfazendo de ativos para reduzir endividamento. O segundo semestre, avalia, deve ser mais repleto de transações focadas no crescimento inorgânico das companhias. “O retorno da janela de ofertas de ações, com mais empresas captando para crescer, também será um combustível para as operações de M&A”, afirma.

Segundo Bassan, em 2023 o índice de mortalidade das operações foi muito alto por conta das mudanças súbitas de cenário ao longo do ano. “Essa mudança de condições atrasa as transações.”

Eduardo Miras, responsável pelo banco de investimento do Citi no Brasil, afirma que a queda do volume em 2023 recolocou a indústria de M&A em patamares pré-pandemia, após um período em que o mercado recebeu combustível pela alta liquidez global e juros baixíssimos em todo o mundo. “Entramos no ano de 2023 com uma expectativa bastante positiva, baseada em um pipeline que não se materializou por completo”, afirma.

De acordo com ele, o “pipeline” nas últimas semanas do ano ganhou novas transações e as expectativas se tornam mais otimistas para 2024 à medida que a distância entre o preço esperado pelo vendedor e o desejado pelo comprador começa a ficar mais estreita, o que melhora o ambiente de negócios.

“No momento estamos cautelosamente otimistas, temos sentido no escritório um aumento da procura de bancos e clientes interessados em operações de M&A”, diz o sócio da área de M&A do escritório Pinheiro Neto, Carlos Lima. O advogado afirma que, no comparativo, o Brasil está bem posicionado no cenário global, o que pode beneficiá-lo em termos de operações envolvendo compradores de fora do país.

Corresponsável pelo banco de investimento do Goldman Sachs no Brasil, Ricardo Bellissi, afirma que os diálogos envolvendo potenciais transações se aqueceram. “O sentimento das empresas, se elas entendem que é o momento de ter vantagem competitiva, as incita a darem mais passos. E tem muita gente buscando oportunidade de tirar mais valor”, diz.

Leonardo Cabral, chefe do banco de investimento do Santander Brasil, aponta que outro gatilho para movimentar o mercados deverá vir dos fundos de private equity (que compram participação em companhias), que estão capitalizados. “Por enquanto os sinais são positivos para 2024”, comenta o executivo. O estreitamento da expectativa valuation entre compradores e vendedores, aponta, também ajudará a fomentar o número de transações. “Esse gap diminui com a bolsa subindo e juros caindo”, diz.

Fonte: Valor
Por: Fernanda Guimarães

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